Chamamento à Fraternidade
Dentro do que vem estabelecido dentro da Liturgia da Igreja Católica, hoje estamos passando pelo tempo da Quaresma. O período quaresmal, como o próprio nome sugere, vem a ser o lapso de quarenta dias que transcorre a partir da quarta-feira de cinzas e vai até o domingo de ramos, que marca o início da Semana Santa.
Vê-se, então, que logo após o término do tríduo do Carnaval, a Igreja ingressa num período em que são recomendados esforços dos fiéis católicos, no sentido de se aprofundarem em meditações, estudos e prática de sacrifícios materiais, como jejum e abstinência de carne, tudo com o objetivo de uma conversão de vida, imitando o que teria feito o próprio Jesus Cristo, que jejuou e se preparou para suportar o sacrifício final de sua morte na cruz, pelo mesmo lapso temporal.
A recomendação feita pela Igreja, quanto às mortificações e penitências, no período quaresmal, veio a ser mitigada, notadamente por ocasião da Segunda Guerra Mundial, oportunidade em que os sacrifícios impostos às populações chegaram a ser iguais, se não superiores, ao que era ponderado aos fiéis.
Igualmente no Brasil, a partir dessa época, foi aliviado o conjunto de sacrifícios, tanto mais que se sabia ter o povo brasileiro dificuldade de se alimentar, mesmo em outras épocas do ano.
Novidade interessante, todavia, veio a nascer, há poucas décadas, quando, no Brasil e em alguns outros países, foi criada a Campanha da Fraternidade.
Tendo sido incluída como movimento a ser desenvolvido dentro do período da Quaresma, veio a Campanha da Fraternidade a incluir mais um elemento, tanto como de meditação quanto de ação, assim motivando mais ainda os fiéis, no caminho da conversão.
A Campanha da Fraternidade, tem outrossim, uma característica interessante, qual seja o fato de apresentar, a cada ano, um tema novo, sobre o qual devem se debruçar e agir os fiéis católicos.
Temas como “Luta contra o analfabetismo”, “Valorização da mulher”, “Divisão do Pão” e outros, todos de grande relevância, já foram objeto de campanhas, em períodos quaresmais anteriores.
Para este ano, o tema escolhido, não menos importante, veio a ser “Fraternidade e Povos Indígenas”, dentro do qual a Igreja recomenda que lutemos por uma sociedade onde todos sejam respeitados em seus direitos, como filhos e filhas de Deus.
Nesse particular a própria Igreja convida a que meditemos e nos solidarizemos com a necessidade do resgate da dívida social que temos para com os primeiros habitantes de nosso país.
O tema deste ano, sem dúvida, nos remete aos tempos da descoberta da América pelos europeus, grande fato histórico do final do século XV e início do século XVI, ocasião de grande mortandade de indígenas, notadamente no sul da América do Norte e América Central, quando os espanhóis, trucidaram, violenta e desnecessariamente, várias centenas de milhares de nativos, astecas e de outras tribos, que ali precederam os conquistadores.
Essa recomendação agora feita, válida e profunda, de meditarmos e agirmos, no sentido de resgatar a dívida, embora contraída e reconhecida pela Igreja Católica, não deveria ser exclusiva para os seus fiéis praticantes, mas, deveria alcançar todos os povos do mundo , de modo que todas as diferenças entre eles pudessem ser desfeitas, seja entre israelenses e palestinos, católicos e protestantes irlandeses, negros e brancos, sempre tendo em mente o que a Igreja relembra nestes dias: “Somos todos filhas e filhos de Deus”.
Tunico Vieira
15/03/2002