O Poder Judiciário na berlinda
Segundo definição constitucional, são três os poderes da República: Legislativo, Executivo e Judiciário, tripartição que vigora no mundo desde a revolução francesa, doutrina que estabelece o governo do povo, pelo povo e para o povo, valendo acrescentar que ao poder legislativo compete a elaboração das leis, sem as quais não existirá o Estado de Direito, ao poder executivo cabendo a administração do país de acordo com a legislação em vigor, restando ao poder judiciário a função de aplicar a lei nos casos de transgressão ou desentendimentos entre partes que litigam a respeito de prejuízos sofridos.
O poder judiciário, no Brasil, tem uma situação diferente com relação aos outros dois, que se localiza exatamente no fato de ter os seus membros não escolhidos pela vontade popular, Enquanto os componentes dos poderes legislativo e executivo são eleitos pelo voto popular, em todas as áreas, municipal, estadual e federal, os juízes, desembargadores e ministros, ou entram para os órgãos jurisdicionais após prestarem concursos públicos, ou são nomeados diretamente pelos governadores e presidente da república, sem qualquer consulta à consciência popular.
Outro ponto de distinção, ainda entre o poder judiciário e outros poderes, é o fato de que a nomeação do julgador tem validade perene no tempo, ou seja, a garantia de vitaliciedade, até a aposentadoria, ou morte; como se sabe, os membros dos poderes executivos exercem os cargos por lapso temporal definido, e, decorrido este, só permanecerão no caso de reeleição.
Essas duas posições de situação diferente já são suficientes para suscitar opiniões desfavoráveis, do povo em geral, quanto ao desempenho dos órgãos da justiça, queixas surgindo, variadamente, seja pela ocorrência de casos de corrupção de autoridades judiciárias, seja pela lentidão no julgamento das ações, seja, ainda, por alegadas injustiças praticadas pelos órgãos julgadores.
As reclamações contra a atividade do poder judiciário são cíclicas, isto é, elas aparecem e amainam de tempos a tempos; entretanto, nos últimos dias foram elas reavivadas em decorrência de manifestação pública do presidente da república, referindo-se à necessidade de ser procurada uma solução à situação do poder judiciário, que não tem interesse em se deixar exposto, com seus problemas, ao crivo da nação (chamada “caixa preta”).
E, sempre que o poder judiciário é objeto de críticas e pedidos de providências, para que tenha funcionamento regular e não cause prejuízos aos jurisdicionados, vem à baila a proposta de criação de um “controle externo do judiciário”, a saber, uma entidade cuja finalidade seria observar a conduta dos senhores magistrados, e que seria formada por pessoas representativas de órgãos ou entidades alheias à administração da justiça.
Claro está que os componentes dos nossos tribunais se opõem frontalmente à existência de tal “controle”, tanto porque os tribunais têm, cada um, a sua respectiva corregedoria, que possui a mesma finalidade, como porque, a submissão do juiz a tal entidade controladora seria um indesejável constrangimento ao prolator de decisões, de tal grandeza que poderia influir no julgamento a ser dado às causas sob sua responsabilidade.
Outras opiniões, ao contrário, apóiam a iniciativa cogitada, que já figurou em projeto de lei que não chegou a consenso para ser votado.
Inegável é, todavia, que o tema merece continuar sendo debatido, e cada qual tem o direito de expressar o seu sentimento a esse respeito.
Parece-nos, porém, e em conclusão, que o controle externo não teria o condão de fiscalizar a atividade jurisdicional quanto ao mérito das decisões proferidas pelo magistrado, mas, apenas e tão somente, quanto a seu modo de agir, dentro da atividade processual, principalmente quanto ao respeito aos prazos previstos da lei respectiva, nem sempre observados, como é o caso que se vê com freqüência, nas notícias dos periódicos, de ações que demoram mais de 10 ou 15 anos para serem encerradas, o que certamente não aconteceria se o juiz cumprisse com a observância, para si, do prazo cujo respeito ele exige das partes.
Por outro lado, não há porque o juiz ser contra a fiscalização de um conselho, mesmo que formado por pessoas alheias ao poder judiciário.
Como mencionado pelo próprio magistrado José Renato Nalini, MM. Presidente do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, “O juiz honesto, que trabalha, não tem medo do controle”.
Tunico Vieira
06/06/2003