ALCA, para os leigos
A formação ou instituição de uma sociedade, em princípio, soa como uma reunião de vontades no sentido de ser desenvolvida uma atividade que possa produzir um resultado favorável e que propicie algum benefício (lucro) para todos os sócios seus componentes.
É muito antiga aquela história, ou fábula,conhecida desde os tempos de Esopo, da associação do leão com a cabra, a ovelha e a vaca, para a divisão do produto da caça obtida pelo grupo, e que seria dividida em partes iguais entre os associados, o que deu origem àquilo que hoje conhecemos como “cláusula leonina”, ou seja, o acordo que só interessa fazer valer para um dos membros, causando o prejuízo do outro, ou outros.
Embora não se possa dizer, com a certeza definitiva, que a união dos animais, acima citada, tenha alguma ou muita semelhança com a Área de Livre Comércio das Américas – entidade cuja criação está sendo tentada e que é mais conhecida como “ALCA”, a verdade é que, para os leigos, ou pessoas que não tenham noção mais profunda das regras aplicadas ao comércio internacional, fica a impressão primeira de que, embora ainda em embrião, custa crer que os Estados Unidos tenham lançado a proposta de criação da ALCA, com as cláusulas nela enunciadas, objetivando favorecer em termos de igualdade, na área de comércio exterior, os demais países da América.
A primeira coisa que salta aos olhos e chama a atenção, sempre considerando o fato de que se está mencionando a visão de leigo, é a menção feita à exclusão de Cuba, contida na proposta de Washington, uma vez que ela certamente surgiria, no decorrer dos debates e apresentação de contra-propostas dos outros países e a exclusão se consumaria fatalmente. Pode-se dizer, por isso, que nesse fato já podemos ver um dente do leão.
Ainda sempre dentro do ponto de vista da pessoa não especialista no tema em foco, outros pontos podem ser mencionados que denotam o tratamento desigual proposto pelo país que deu início às tratativas, que favorece mais os países da América Central, em detrimento daqueles que compõem o Mercosul.
E não somos nós, os não especialistas, que assim vêem e sentem a questão; na verdade, o noticiário da imprensa, nos últimos dias, é pródigo em considerações de representantes do governo, que alertam para essa situação, valendo mencionar que o próprio chanceler brasileiro, Celso Amorim, que preferiu entender que a proposta norte-americana não se refere a um tratado a ser assinado para a criação de uma entidade envolvendo os países americanos, mas, a uma série de acordos, “segmentados”, cada qual com um país americano distinto.
Existem ainda outros temas relacionados com o livre comércio nas Américas, que não chegaram, sequer, a ser objeto da proposta inicial, como por exemplo, fornecimento de crédito para as exportações, para a agricultura, exclusão de barreiras técnicas e outros, observação que também já consta de manifestação de “experts” em periódicos, podendo ser entendido, como observação final, que a questão é bastante complexa e abrangente, não sendo possível esperar que a ALCA seja, tão cedo, uma realidade.
De qualquer forma, resta-nos a certeza de que o governo brasileiro, estando ciente do que nos espera, neste setor, cuidará para que, concretizada a existência da ALCA, não fique o Brasil sem a sua fatia do bolo.
Tunico Vieira
28/02/2003